tales of a warm winter (2)

- Queres uma? Estão quentes.
Valia a pena expor as mãos ao ar frio por um pedaço de calor como aquele. Como duas crianças que desembrulhavam um presente, as suas mãos descascavam as castanhas com uma rapidez hábil.
Os passos deles eram demorados. Não como alguém que não sabe onde ir, não como alguém que não quer ir para onde vai. Eram passos de quem tem todo o tempo do mundo, de quem não estaria melhor em mais lado nenhum.

Afinal o Inverno comia-se. Ambos pareceram perceber isso simultaneamente. As luzes ganharam intensidade à medida que o papel de jornal ia ficando vazio. Em simultâneo também, uma sombra alcançou-os, passando depois por eles, acariciando-os e fugindo de seguida. Os seus olhares ergueram-se e, por magia ou não, cruzaram-se. Dois sorrisos anteviam o próximo passo.
- Nunca andei de teleférico à noite.

O rio apresentava-se luminoso. Um grande espelho da noite, que abarcava todas as faces da Lua. Lá em baixo, o corrupio de felicidade instantânea desvanecia-se num rasgar de papel. As luzes não passavam de um clarão que tentava em vão tirar protagonismo à Lua.
Sentada ao seu lado, e como que a sucumbir ao êxtase do dia e à emoção da vida, ela inclinou-se na direcção dele. Era um calor diferente do das luzes ou da música com sininhos. Era um calor diferente do das vozes cruzadas e projectadas na rua. Ele fingia não estar atento, olhando para o infinito através da janela. Mas ela encostou lentamente a sua face no peito dele, fitando também o mundo lá em baixo. E quando ela fechou os olhos e se aninhou no seu casaco, ele permaneceu fisicamente imóvel, com os olhos sempre pousados no céu escuro.

Mas, agora, no silêncio total das paredes de vidro, ele conseguia sentir a respiração dela. Era um Inverno diferente, aquele que ela agora respirava. Não era a estação viva e luminosa, barulhenta e sorridente que se vivia lá em baixo. E continuava a não ser a estação sombria e arrepiante, cinzenta e claustrofóbica que ambos detestavam.
O cabelo dela é que cheirava a Inverno, reconsiderou ele. E as duas luzes brilhavam mais agora do que quando as cascas das castanhas eram distraidamente deixadas cair na avenida cheia de vida. O teleférico não ia parar, a Lua não ia deixar de brilhar, e o Inverno haveria sempre de cheirar assim.

2 comentários:

Sofia disse...

oh... está tão bonito :')

Anónimo disse...

Adoro aquilo que escreves, como todas as outras pessoas que se pronunciam :)
Estimulas a mente e desenhas os mais bonitos quadros na cabeça de quem lê.

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