posso fingir que estou a distribuir panfletos sobre a gripe. ou sobre a fome no mundo. ou sobre os teus olhos e a forma como usas sempre dois guardanapos para agarrar as tiras de torrada. isso só interessaria a mim, mas aí já teria desculpa para correr atrás de ti, tocar-te até no ombro, sorrir, dizer
-olá, muito bom dia, como está, passou bem, tem dois minutinhos?
pedir-te dois minutinhos com o descaramento que é sempre desculpado a quem está no marketing. sim, talvez devesse afixar a minha admiração por ti em muros velhos, cartazes todos iguais, uns a seguir aos outros, tu sabes como se costuma fazer. quem sabe, marcar um encontro
-na mesa do canto, perto da janela
e só tu saberias. os outros achariam estranho, os turistas tirariam fotografias, as crianças apontariam e perguntariam aos pais onde ficava aquele país Mesa do Canto (e na verdade aquela mesa é um país aos meus olhos, tem uma bandeira com malmequeres, um hino a nós e a moeda de troca são tiras de torrada - as do meio valem o dobro, claro.) tu talvez parasses durante menos tempo que os restantes, e no entanto teria sido a ti que o cartaz tinha tocado. verias e acelerarias o passo com medo que alguém reparasse que afinal aquilo tinha significado.
-afinal o amor existe, hey, ouçam todos, afinal o amor existe!
e rir-se-iam de ti. por isso, olharias para um lado e para o outro, como fazem as pessoas que caem em público - e tu caíste, caíste em ti - e continuarias a andar, mas em direcção a mim.
I.W. @
Escrito ao som de "Bakery" - Arctic Monkeys.