Havia um odor no ar. Cheiro a carvão? Não, cheiro a Inverno, pensou ele. Eram castanhas acabadas de assar, estacionadas no fim da rua. O esguio candeeiro, já débil, iluminava vagamente o vulto encorpado e mascarrado de avental escuro. Não era uma noite sombria. Não era uma noite daquelas em que o silêncio se apoderava dos prédios e em que os passos apressados de alguém assustado enchiam as ruas com o seu eco.
Havia gente na avenida. Havia o Jingle Bells a percorrer as vielas estreitas, a abraçar os solitários. Havia castanhas acabadas de assar, e calor a saltar nas mãos. Havia sorrisos. Havia luzes a aquecer o olhar dos deslumbrados. Era uma noite quente, e o Natal estava aí.
-quero castanhas.
Ela inspirou o Inverno. Os seus ombros encolheram-se, apertou mais o casaco comprido junto ao corpo. O seu olhar espreitou atrás da grande gola branca. Quente, reflectia a luz do candeeiro mais próximo. Brilhava. Sorria.
À volta havia sacos. Não eram pessoas, mas sacos andantes, empilhados, aglomerados, que se atravessavam à frente dos carros em movimento e que gritavam para o outro lado. Eram sacos, cujas cores se misturavam e aqueciam o olhar, que pediam para passar e que diziam boa noite apressadamente. Eles ouviam a parafernália de sons característica das noites quentes, acenavam, abrandavam e esperavam.
Nem ela nem ele eram sacos. Eles eram luz. Duas luzes que brilhavam mais que o débil candeeiro, mais que as sucessivas lâmpadas coloridas que cantavam melodias com sininhos. Mas eram duas luzes no silêncio das suas redomas. Eram duas luzes que só brilhavam uma para a outra, e que não precisavam de cantar sininhos para se fazerem entender. Eram um olhar quente e um sorriso dissimulado.
2 comentários:
ahhh, ja tinha lido este texto! era o das castanhas. :p está genial :3
não te preocupes, que eu também fico bastante monossilábica no teu, embora me perca sempre neste blogue.
não deixes tu também!
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