Não quero mais os restos de felicidade dos outros.

Se tu és a borboleta linda que todos correm para apanhar quando o piquenique está a meio, aquela que pode fugir e voar e rodopiar com a certeza de que alguém tropeça para a seguir, eu sou o papel sujo e amarrotado que alguém deixou cair distraidamente no chão, entre ervas feias que nem são malmequeres, depois de te ver e antes de te tentar apanhar. E tu não sabes o que é isso, nunca estiveste muito tempo perto destes bichos que emergem da terra e que me segredam à noite todas as classes de palavras que têm subclasses de negação, todos os pretéritos imperfeitos, e todas as frases subordinadas condicionais e impossíveis. Porque tu tens asas e foges quando queres, para onde queres e com quem queres, e a mim deixaram-me aqui sozinha num mundo que eu não pedi pelo Natal. Num mundo onde as condições necessárias à realização do que quero são simplesmente inacessíveis, dadas todas as razões de que te possas lembrar e ainda o facto de eu me encontrar fisicamente no chão, onde nada chega a não ser chuva e migalhas do que outrora foi um bolo delicioso. Um bolo delicioso que eu nunca cheguei a provar. Mas tu sim, claro. Porque tu fazes tudo o que não faço. 

E eu fico aqui, imóvel, a ver.

*Carolina*

#18 letter to the person you wish you could be

2 comentários:

Dan disse...

Escreves tão bem ^^

Eu gosto *

Aya disse...

As borboletas nunca acentam os pés na terra, nunca estão em contacto com a realidade... Para além disso vivem pouco tempo, algumas não chegam a viver 3 dias, nos quais têm de se empenhar em ajudar a sobrevivência da espécie dando origem a mais borboletas. Vivem apenas com a missão de espalhar a sua beleza e o seu simbolismo. Apesar de tanto trabalho como lagarta, tanta energia gasta na metamorfose, a sua vida esvoaçante é tão efémera como a de uma bola de sabão comum.

Os papéis amarrotados transformam-se permanentemente... pela chuva, pelo vento, por um sapato anónimo, e um dia poderiam contar uma história de peripécias incríveis pois são eternos...
É como se metamorfoseasse ao sabor do mundo... e diria que são mais sábios do que qualquer coisa distraidamente esvoaçante...

E agora, quem achas que vive realmente? A borboleta ou o papel?

;)

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